Não há muitos como ele. Talvez ninguém. Afinal, quantos se podem orgulhar de ter descoberto dois vencedores da Bola de Ouro? Dois dos melhores do mundo no seu tempo — e provavelmente de sempre. Sim, talvez ninguém.
Aurélio Pereira é o “senhor formação” em Portugal e no Sporting. O “seu” Sporting, onde foi futebolista ainda menino, onde foi treinador de outros meninos como ele o foi um dia, e onde, há trinta anos, dirige o departamento de recrutamento do clube. O mesmo departamento que descobriu os tais Bola de Ouro, Luís Figo e Cristiano Ronaldo, mas que também descobriu Paulo Futre, Simão Sabrosa, Ricardo Quaresma, Nani e tantos, tantos mais.
Em entrevista ao Observador, Aurélio Pereira, falou do “segredo” que há na descoberta de talentos. Mas também sobre o que distingue um futebolista talentoso, mas “mal aconselhado” e que não triunfa, de um futebolista com talento e que trabalha esse talento com suor — e chega onde só chegam os melhores.
Desafiamo-lo ainda a falar, um por um, dos “meninos” que descobriu e amanhã podem sagrar-se campeões europeus em França. De cada um tem uma história e a todos trata com o carinho que só um pai (ainda que não os seja) tem por estes filhos de afeto.
Cristiano Ronaldo. Foi “carote”, mas Aurélio não se enganou muito
Eu gostava de falar um bocadinho consigo de cada um dos “sportinguistas” que estão no Euro. E das memórias que tem deles enquanto jovens. O Ronaldo é, ainda hoje, o maior talento que viu na formação? A verdade é que nunca o Sporting pagou tanto por um miúdo de apenas 12 anos…Ainda me lembro de quando o vi a treinar pela primeira vez. Muitos miúdos que vêm treinar ao Sporting, e são da Madeira ou dos Açores, sofrem de uma certa insularidade, têm dificuldades em se adaptar e no dia seguinte a treinarem vão apanhar um avião de volta para casa.
Com o Ronaldo não foi assim. Ele chegou a Lisboa com 12 anos, veio acompanhado por um padrinho, foi treinar com miúdos que até eram mais velhos do que ele, e todos, os colegas e os treinadores, ficaram boquiabertos. Era um líder. Ao fim de cinco minutos, já os tratava a todos por tu, por “miúdo”, dizia “ó miúdo, passa a bola”, “ó miúdo, tem calma”, e isso não é normal.
O Ronaldo custou-nos cinco mil contos. Cinco mil. Mas eu sabia que tínhamos que avançar para a contratação dele logo naquela altura. Ele tinha que vir para o Sporting. Quando fui à administração, eles ficaram muito aflitos, o diretor financeiro perguntou-me se eu tinha a certeza de que ele valia tudo aquilo, e eu respondi-lhe: “O arriscado é não pagar, mas o senhor doutor é que sabe”, e saí. Ao fim de meia hora, recebi um recado: tinham aceitado pagar os cinco mil contos. E, sem querer ser pretensioso, acho que não me enganei muito.
0 Comentários