Bernardo Jorge, o seu verdadeiro nome, foi enterrado enquanto dezenas de vozes entoavam o tema mais popular do artista, “Wendele” (Cuidado).
Entre a multidão estavam cantores e compositores seus contemporâneos, mas também os mais novos, que não querem deixar o semba acabar e emprestam a sua criatividade na criação de novas composições.
O velório decorreu na manhã de ontem, no Pavilhão da Cidadela. Estiveram presentes membros do Executivo, figuras representativas da sociedade civil, familiares e artistas, muitos dos quais acompanharam Bangão em palco.
O ambiente era de grande pesar. A música popular urbana deve muito a Bangão. Mas neste momento em que os ritmos populares conquistam espaço nos palcos internacionais, muito ainda se esperava do  criador de sembas que vivem e vão continuar a viver na memória de milhões de angolanos.
O carro funerário que transportou a urna de Bangão para o Cemitério do Alto das Cruzes chegou cerca das 13h00. No largo, centenas de fãs e amigos do artista estavam presentes para lhe dizer o último adeus. Por trás, o sol de cacimbo brilhava na Baía que ele tanto amava. Foi um momento de grande emoção.
As lágrimas caíam de muitos rostos e vozes em surdina entoavam o semba “Wendele”. Episódios da vida do cantor e compositor eram recordados pelos presentes. O artista seguramente não sabia que vive no coração de tantos angolanos que apreciam a sua arte musical.

Artista inigualável

Bangão partiu mas deixou uma legião de admiradores que ontem estiveram presentes no Cemitério do Alto das Cruzes, recordando o contributo inestimável do artista para a música popular urbana, que ele representou e com um talento inigualável.
A multidão que se concentrava no largo em frente ao Cemitério do Alto das Cruzes tentou acompanhar a urna até à sepultura. Mas era tanta gente que nem todos puderam entrar. Houve um momento em que os funcionários tiveram de encerrar os portões e os agentes da Polícia Nacional ajudaram a manter a ordem.  Centenas de fãs e amigos de Bangão acompanharam a urna até à “última morada”. Mas muitos mais ficaram no exterior do cemitério, expressando dor e trauteando os sembas mais populares do músico e compositor.
Agentes da Polícia Nacional em serviço, quando a urna de Bangão saiu do carro funerário, puseram a mão no peito, junto ao coração. Alguns não contiveram as lágrimas. O artista era muito popular e tinha uma ligação directa ao “coração do povo” que o admirava e amava.

Kabocomeu e Kiela

Grandes artistas estiveram presentes no Cemitério do Alto das Cruzes para dizerem adeus a um dos maiores intérpretes e criadores de semba. A nossa reportagem registou nomes como Dom Caetano, Prado Paím, Nagrelha, K King, Matias Damásio, Yola Semedo, Big Nelo.
Os grupos carnavalescos do Sambizanga, Kabocomeu e Kiela, prestaram homenagem a Bangão. Cantaram os seus maiores sucessos, enquanto a urna seguia para a sepultura. Foi um momento de grande emoção, envolvido no melhor da arte popular de Luanda. Bangão e o genuíno Carnaval luandense sempre viveram de mãos dadas. Essa parceria foi ontem visível nas veredas do Cemitério do Alto das Cruzes.
A alegria deu lugar à tristeza. Mas o que ficou visível, o que todos ouviram, foi a arte de Bangão interpretada por aqueles que teimam em manter viva a cultura popular e uma das suas mais importantes vertentes: o semba.

Trânsito parou

Enquanto o carro funerário seguia da Cidadela em direcção ao Cemitério do Alto das Cruzes, o trânsito nas ruas adjacentes foi cortado. Nas janelas e varandas dos prédios, dezenas de pessoas diziam adeus ao genial criador de “Wendele”. Luanda despedia-se de Bangão, um dos seus mais inspirados artistas.
Depois da cerimónia fúnebre, a multidão dispersou. No Centro Recreativo Erme, no Sambizanga, os familiares de Bangão receberam os sentimentos dos amigos e fãs de Bernardo Jorge Bangão.
A ministra da Cultura, Rosa Cruz e Silva, e os governadores provinciais de Luanda e Malanje, Graciano Domingos e Norberto dos Santos, segundo vice presidente da Assembleia Nacional, Bento Bento, e o presidente da Comissão Administrativa de Luanda, José Tavares, estiveram entre os que acompanharam o artista à “última morada”, além de magistrados judiciais e do Ministério Público, oficiais das FAA e da Polícia Nacional.
A sepultura do artista Bangão está localizada do lado direito da capela funerária (para quem entra) do Cemitério do Alto das Cruzes. Uma das vozes do semba foi a enterrar. Mas as suas composições vão continuar a viver com as nossas alegrias e tristezas. “Wendele”! Tirem o chapéu a Bangão.
A missa de corpo presente foi celebrada pelos bispos Luís André Braga, Felner Batalha e João Bartolomeu, da Igreja Universal do Reino de Deus, congregação a que o músico pertencia.

Emoção na hora da partida

Na elegia fúnebre, momentos antes da urna deixar a sepultura, os familiares de Bangão destacaram-no como homem de trato fácil, amável e artista consagrado pelo seu povo, em função do retrato do quotidiano nas suas composições. As tradições, lendas e contos que cantava e informava na sua obra, disse o primo Chico Correia, foram um contributo para a música angolana proveniente de um ídolo preocupado com a vida dos desfavorecidos. “Tudo o que foi dito é insuficiente para descrever o que Bangão fez durante os 36 anos de carreira”, disse com lágrimas no canto do olho.

Obra a ser preservada

A ministra da Cultura defendeu que as obras de autoria de Bangão, um dos expoentes máximos da música semba nos últimos dez anos, carece de protecção por forma a mantê-las vivas para as futuras gerações.
O Artista Mais Querido de 2005, disse Rosa Cruz e Silva à margem do velório, deixa um legado indelével, daí o compromisso em preservá-lo para servir de estudos .

Presidente da República elogia carreira de Bangão

O Presidente da República, José Eduardo dos Santos, referiu ontem, a propósito do falecimento de Bangão, que a Nação “perde um dos maiores vultos da sua história musical que nas últimas décadas soube conquistar muitos adeptos com as suas belas composições e interpretações, que constituem uma referência e fonte de inspiração para os artistas das novas gerações”.
Numa mensagem de condolências à família do cantor, o Chefe de Estado salienta “o contributo inestimável” de Bangão na “criação da música angolana moderna, absorvendo as influências salutares externas dos ritmos de outros continentes e culturas, mas preservando os elementos essenciais da música tradicional angolana”.
 “Eu e a minha mulher curvamo-nos perante a sua memória e apresentamos as mais sentidas condolências a todos os familiares, amigos e fãs do inditoso”, conclui a mensagem do Presidente José Eduardo dos Santos.

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